O investimento central na primeira fase, de R$ 1,6 bilhão, erguerá a Maltaria Campos Gerais, em Carambeí, município-sede da cooperativa Frísia. A intercooperação envolve ainda outras cooperativas de diferentes municípios do Estado do Paraná: a Castrolanda (Castro), a Coopagrícola (Ponta Grossa), a Bom Jesus (Lapa), a Capal (Arapoti) e a Agrária (Guarapuava).
Avançadas, as obras devem permitir que a nova Maltaria entre em operação no início de 2024. Quando plenamente funcionar, irá produzir 240 mil toneladas de malte por ano, cerca de 15% do mercado nacional. Estima-se um acréscimo de plantio de 70.000 hectares com cevada, necessário para alimentar a agroindústria.
Na semana passada, estive em Carambeí (PR) para conversar com os produtores rurais cooperados sobre os desafios do agronegócio no Brasil. Pude comprovar, pelo projeto da cevada, que eles os estão superando. Destaco 7 questões principais:
- Cooperação: No mundo competitivo em que vivemos, quem fica isolado periga ser engolido. O cooperativismo expressa, de seu berço, a força da união. No Paraná, especialmente, talvez pelo traço europeu da sua formação, as cooperativas são exemplares e poderosas, enchem de orgulho o agro brasileiro.
- Mercado: Antigamente, bastava produzir e vender. Hoje, os consumidores são exigentes, demandam categoria. Não adianta produzir qualquer cevada, pois o malte dela resultante pode ter baixo valor. Vale para bebedores de cerveja, como também de café, de suco ou de vinho. A origem da qualidade está no campo.
- Avanço tecnológico: Para assegurar a qualidade da cevada e, consequentemente, do malte, as cooperativas contam com 2 órgãos próprios de pesquisa agropecuária: a Fundação ABC (Frísia, Capal e Castrolanda) e a Fapa (Agrária). A Embrapa, claro, fornece tecnologia, mas as cooperativas, às suas expensas, investem no conhecimento agronômico. Isso é extraordinário, inusitado.
- Sustentabilidade: A região dos Campos Gerais, no Paraná, é peculiar. Exige cuidados para manter a fertilidade de seus solos. Sabem disso os agricultores ali instalados, a maioria descendente de alemães, poloneses e holandeses, reconhecidos entre os melhores do mundo. A cevada deixa uma enorme massa vegetal no terreno que, utilizada como cobertura morta no sistema de plantio direto, contribuirá positivamente para a matéria orgânica e a biologia do solo. Cevada regenerativa.
- Renovação: O tradicionalismo não consegue vencer na competição do mundo atual, colocando o tema da sucessão familiar entre os principais desafios do agro. É necessário segurar, atrair e empoderar a nova geração. Em Carambeí, eles inclusive organizaram o 3º Rally Técnico da Cevada. Muito bacana. Os jovens adoram novidades.
- Empreendedorismo: A coragem das cooperativas em investir na própria maltaria significa uma espécie de alforria, para sair das garras das unidades compradoras ligadas às cervejeiras, contumazes em depreciar sua cevada. Decidiram, então, topar a briga e agregar valor ao grão. Sensacional.
- Gestão eficiente: O projeto da cevada mostra muita competência, com estratégias definidas, metas estabelecidas, retornos calculados, vendas antecipadas. As cooperativas agropecuárias não brincam em serviço, por isso crescem sem parar. São bem geridas, têm elevada rentabilidade e distribuem “sobras”, aos milhões, para seus associados, os verdadeiros donos do negócio.
Por tais razões, voltei animado do Paraná. O Brasil importa mais da metade do malte utilizado nas cervejarias do país. A parceria das cooperativas nos Campos Gerais indica, porém, que esse jogo vai virar.
O agro nacional, com o passe das cooperativas, dará de goleada.
Por Xico Graziano, membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS)