Brasil precisa investir mais em pesquisa de cana e na renovação da lavoura, diz economista
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A avaliação é do economista Eduardo Pereira da Carvalho, que foi presidente da Unica, importante representante das usinas do centro-sul, de 2000 a 2007, período de forte crescimento da safra do país, quando alguns até sonhavam que o Brasil seria uma “Arábia Saudita do etanol“.

Na véspera, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) divulgou sua primeira estimativa de safra para a temporada 2023/24 que se inicia, com um crescimento de 4,4%, a 637,1 milhões de toneladas no Brasil, enquanto a previsão do centro-sul ficou em 577,3 milhões de toneladas.

O avanço da safra brasileira ocorrerá com um ligeiro aumento de 1,5% na área, após o total cultivado no país ter caído para o menor nível em mais de dez anos no ciclo passado, e com alguma recuperação na produtividade, para 75,7 toneladas por hectare.

Mas tais números estão distantes do recorde no Brasil visto oito safras atrás, quando o maior produtor e exportador global de açúcar processou 665,6 milhões de toneladas de cana. Se o assunto é produtividade média, a máxima histórica está ainda mais longíqua: o país colheu 81,6 toneladas por hectare em 2009/10.

“Precisa investir em tecnologia, este foi um dos grandes pecados do setor… A produtividade estagnou porque parou de pôr dinheiro”, disse Carvalho, o primeiro presidente da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica) não usineiro, que lança um livro de memórias sobre sua vida profissional e pessoal na noite desta quinta-feira, em São Paulo.

Segundo ele, foram os investimentos principalmente da Copersucar de dezenas de milhões de dólares no passado que fizeram saltar a produtividade de 50-60 toneladas/hectare para 80-90 toneladas/ha em São Paulo, em um período de 15 anos.

Este investimento em pesquisas futuras também poderia ter apoio governamental, considerou ele, em uma ação conjugada com o setor privado como foi no Pro-álcool, programa de substituição em larga escala da gasolina.

Simultaneamente, o Brasil precisaria trabalhar com canaviais mais jovens, que não durem mais de cinco ou seis safras, uma vez que lavouras envelhecidas produzem menos. Para isso, seria preciso investir e acelerar taxas de renovação de canaviais para 20% das áreas, ao ano, que chegaram a cair para menos de 10%, “diminuindo brutalmente a produtividade da cana”.

Ele avaliou também que o “grande esforço revolucionário”, que envolvia pesquisas com variedades transgênicas, vem sendo feito ainda de forma tímida. Assim, disse o economista, o setor segue em boa parte dos canaviais com plantas ainda pouco adaptadas ao corte mecânico, que se acelerou em meados da década passada, em substituição à queima da cana e ao brutal corte manual.

“Estamos pagando o custo disso até hoje”, disse, explicando que o corte mecanizado, mais correto social e ambientalmente, exige variedades de cana com mais fibras, enquanto toda a pesquisa antes era para uma planta com maior teor de sacarose.

“Ainda não estão colhendo canas mais apropriadas, as variedades usadas hoje são as de 20, 30 anos atrás, de maneira geral”, frisou.

“Só cai quem monta”

Carvalho, que lança “Só cai quem monta – memórias de um economista” –livro no qual conta sua trajetória com passagens por ministérios, secretarias de Estado, direção de bancos como o Banespa e empresas como a Vale, sendo a Unica uma das mais “profícuas” de sua vida–, não via um destino das Arábias para o etanol como produto de exportação.

Ao contrário, ele destacou que, com o etanol, o Brasil foi palco do primeiro ciclo de commodity voltado para o mercado interno.

Ele acreditava sim que o maior uso do etanol como mistura em outros países produtores de cana –como começa a se delinear na Índia– poderia reduzir a disponibilidade da matéria-prima para produção de açúcar, elevando os preços do adoçante e gerando boas margens para as indústrias.

Uma parte importante do livro editado pela Terceiro Nome é dedicada à indústria de açúcar e etanol, incluindo um capítulo em que ele narra como chegou a ser sócio minoritário do que seria um dos maiores projetos do setor, que teve impulso da antiga Odebrecht.

Apesar deste movimento empresarial após sua saída da Unica –descrito no capítulo “O último (?) tombo”– não ter sido bem-sucedido, como o próprio título diz, Carvalho não se intimida em afirmar que hoje, diferentemente do passado, “falta-nos o espírito do empresário de sucesso disposto a correr riscos e mudar as coisas”.

“Este impulso não existe mais”, afirmou.